“Vai ter um espaço central, que nós estamos a trabalhar para que seja na Casa Museu João dos Santos, que será a coleção expositiva com algum espólio que já está na posse da junta de freguesia, que será o espaço mãe associado à Casa do Saber Fazer.”
O Museu terá vários núcleos, que serão, “os quatro fornos comunitários da aldeia e as parcerias que queremos fazer com os proprietários dos moinhos, a eira comunitária, tudo associado àquilo que temos vindo a trabalhar: o saber associado ao ciclo do pão.”
Um saber que as gentes da aldeia ainda preservam, apesar da diminuição e envelhecimento da população. Maria Conceição lembra-se do tempo em que eram 1.300 fogos na aldeia e os quatro fornos funcionavam, em simultâneo. Até havia estratégias para se juntarem e marcarem a vez.
Fazia-se um ramo, de carqueja ou giesta, atava-se como se uma vassoura se tratasse, e colocava-se em cima uma pedra. Chamavam-lhe o ninho e colocavam-no à porta do forno anunciando à vizinha mais próxima.
“Ó vizinha, eu pus o ramo no forno, se alguém quiser cozer que vá à minha porta. Se ela cabia com a minha fornada, éramos duas a cozer, se coubessem três, éramos três, se eu enchia o forno era eu sozinha.”
Toda a gente cozia no forno a broa de milho, o trigo era um privilégio das grávidas, recorda Maria Conceição enquanto enumera os passos que são precisos até tirar o pão do forno.
“Primeiro é preciso moer o milho, fazer a farinha, depois peneira-la, depois amassa-la, depois deixá-la fintar, metê-la no forno e depois, tirá-la cozida e comê-la que não havia outra coisa. Não havia trigo, era só quando uma mulher estava para dar à luz que traziam trigo da Covilhã ou de outro lado qualquer, para ela comer.”
Hoje, além da broa, cozem o pão, as picas de chouriço, de bacalhau e de cebola, sobretudo em dias de festa. Mas este saber tem os seus segredos, alguns ligados à fé.
Antes de amassar, benziam-se, depois, faziam uma cruz na massa e diziam: “Nosso Senhor te acrescente, como a água da nascente.”
E acrescentava, como a água que corre na ribeira do Porcim, por onde se estendem os moinhos onde antigamente, e ainda hoje, era moído o milho que se deitava na moenga, depois passava para a francela e daí para a pedra que, movida a água, o transformava em farinha.
Outro dos segredos deste saber fazer está no forno. É preciso saber a temperatura ideal para colocar o pão. Sem os botões digitais dos tempos modernos, o forno a lenha tem outras formas de comunicar, como explica Maria Conceição, apontando para a porta de ferro do forno.
“Quando a gente o acende está todo negro, à medida que vai aquecendo põe-se branquinho, como aquele panal.” Agora, aponta para o pano que cobre a massa, que o forno haverá de transformar em pão.
Há ainda um terceiro segredo, para as picas de azeite, bacalhau, chouriço ou cebola não agarrarem ao chão do forno. “Pomos uma folha de couve no fundo” que, no final, se retira ficando o decalque na base da pica, deixando-a florida.
Maria Conceição já perdeu o conto à quantidade de pão que amassou na vida. “Oh, minha senhora! Todas as semanas uma fornada de 17 ou 18 broas para a família quando estava em casa.” Numa época em que ainda se semeava o milho e o centeio, “depois íamos ceifar, malhar, temos ali a eira, o meu marido também malhava com o mangual, aquilo era uma festa.”
É este saber que a presidente da junta de freguesia pretende ver preservado e transmitido a outras gerações.